Normalmente falamos aqui sobre pneus e detalhes curiosos sobre este pedaço de borracha preto e redondo, mas nas últimas semanas a indústria automotiva como um todo se deparou com uma espécie de pandemia exclusiva: uma severa crise com a falta generaliza de chips!
Estados Unidos, Alemanha, índia, Coreia do Sul, até mesmo na China, não importa de onde é a montadora, elas simplesmente não conseguem mais produzir seus carros!
Isso acaba sendo mais um sério golpe para uma indústria já debilitada pelas consequências da pandemia global de COVID-19 em um momento chave por conta de impulsos regulatórios crescentes no sentido de termos carros cada vez mais tecnológicos e ambientalmente amigáveis. Em uma análise simplista, ambos os lados, montadoras de veículos e fabricantes de semicondutores e chips “perderam o bonde” nos cálculos de produção e demanda.
É verdade que, há anos, a produção global de veículos está “estagnada” entre 70 e 80 milhões de unidades por ano e que, em 2020, este número caiu 15%, para pouco mais de 66 milhões de veículos vendidos no mundo, mas o julgamento equivocado das expectativas e uma busca praticamente unanime de focar investimentos em negócios de maior lucratividade acabou gerando um desequilíbrio grande entre oferta e demanda.
Demanda não significa apenas o número de carros, mas neste caso, de quantos chips cada um deles necessita! Peças e componentes eletrônicos representam 40% do custo total de um veículo com motor a combustão, quase 20% a mais do que representava 20 anos atrás.
Estamos falando de veículos menos sofisticados que aqueles previstos para a nova mobilidade, híbridos, elétricos, movidos a hidrogênio, autônomos! Logo, não é um absurdo pensar que a demanda tende a crescer de forma proporcional, talvez exponencial, conforme aumentamos o nível de sofisticação dos nossos carros, tanto que a Deloitte previu em abril de 2019 que o mercado de eletrônica automotiva tivesse o maior crescimento do setor, chegando a responder por 12% de toda a receita de vendas até 2022.
Conforme aprofundamos a análise, vemos um cenário cada vez mais crítico e que piora ainda mais quando adicionamos nesta equação que uma série de créditos e incentivos regulatórios concedidos às montadoras em todo o mundo expiram no final de 2021. De acordo com relatórios da PriceWaterhouseCoopers LLP, espera-se que o uso de semicondutores simplesmente dobre já a partir de 2022.
Os ciclos dos chipmakers, do desenvolvimento à certificação, é longo e estabelecer o equilíbrio correto entre oferta e demanda pode ser muito complicado, pois além dos carros, outros eletrônicos e bens de consumo também estão exigindo cada vez mais volumes. Mesmo a pandemia fazendo com que as pessoas começassem a jogar mais videogames ou usando mais seus computadores e smartphones, carros continuam a ser fabricados, com os desafios detalhados acima.
Chegamos à conclusão que não é um assunto de solução rápida e fácil, pois ainda sofremos o reflexo da pandemia nas operações logísticas e os modelos de produção cada vez mais enxutos e econômicos reduzem drasticamente a capacidade de reação das montadoras. Alguns fabricantes chineses possuem apenas poucas semanas de suprimentos, contra um prazo de entrega que chega a beirar três meses.
Tudo isso evidencia a necessidade de uma revolução nos modelos de negócios que a esmagadora maioria das empresas adota atualmente, onde o foco está apenas na geração de lucros e aumento de produtividade e vendas, ignorando uma etapa crucial para o bom andamento dos negócios: o planejamento estratégico! Empresas com visão puramente comercial tendem a seguir a cultura do caçador, aquela de matar um leão por dia, e podem ter sua percepção de médio-longo prazos afetados.
Quando falamos em uma visão focada também em planejamento, devemos estressar constantemente os cenários projetados colocando-os à prova para identificar onde eles podem dar errado, pois seguimos a máxima do “que pode dar errado, vai dar errado”. Não se trata de uma abordagem pessimista, mas de antecipação à problemas e dificuldades para reagir, primeiro, a tempo e, obviamente, causando o menor impacto financeiro possível à operação.
Não é coincidência ou acaso, portanto, estarmos vivenciando esta crise de chips…