Embora montadoras tradicionais como a Volkswagen mostrem um crescimento escalonado na eletrificação de seus modelos, com uma meta de venda de “apenas” 1 milhão de unidades neste ano, outras montadoras tão tradicionais quanto como Ford, Jaguar e Volvo falam em fabricar unicamente modelos elétricos já a partir de 2025! Mas não pára por aí! Além dos concorrentes naturais, gigantes de outras áreas prometem esquentar ainda mais essa briga.
É o caso da gigante chinesa dos celulares Xiaomi, que criou a Xiaomi EV para o desenvolvimento de veículos elétricos, que encerra um ciclo que se iniciou pelo menos desde março deste ano, quando a empresa contratou 300 funcionários ao mesmo tempo que divulgava planos de investimentos de US$ 10 bilhões durante os próximos 10 anos.
Este movimento da Xiaomi é muito mais incisivo se comparado com o realizado pela Apple ainda em 2014, quando do anúncio do Projeto Titan, o carro elétrico da maça. Esses fatos só reforçam a percepção que o carro elétrico dominará o cenário mundial, e brasileiro, já na próxima década.
Algumas cifras que justificam essa afirmação: além dos US$ 10 bilhões da chinesa Xiaomi, temos o compromisso firmado da Ford para investir US$ 1 bilhão em uma de suas fábricas na Alemanha; outros US$ 27 bilhões da General Motors para desenvolvimento e fabricação de carros elétricos – e autônomos – até 2025, além do plano anunciado pela Volkswagen de construir seis giga fábricas na Europa para produzir o equivalente a 240 gigawatt hora por ano em baterias para seguir seu plano de eletrificação.
Em 2020, o carro elétrico já respondeu por fatias importantes de participação em mercados maduros: 74,8% na Noruega, 32,2% na Suécia, 13,5% em Portugal, os mesmos 13,5% na Alemanha, 11,3% na França, 10,7% no Reino Unido, 6,2% na China e 2,3% nos Estados Unidos. Já não parece mais loucura afirmar que alguns países caminham a passos largos para uma frota totalmente elétrica muito antes dos prazos estipulados por regulamentos governamentais para comercialização única de elétricos: 2030 na Alemanha, 2035 na China e 2040 na França, por exemplo.
Além do inquestionável impacto das leis mais restritivas ainda de emissões que vão entrar em vigor na motivação para as decisões em torno da eletrificação e comercialização unicamente de modelos elétricos ou híbridos por montadoras, tudo isso busca atender às necessidades da pauta ESG. E não para por aí: estima-se que a pandemia do novo coronavírus tenha efeito considerável na eletrificação da frota. 2020 foi o ano em que mais se vendeu carros elétricos na história, chegando a 2,3 milhões de unidades, contra 2,17 milhões em 2019.
No Brasil, vemos de forma clara o impacto dessas duas variáveis (pauta ESG e pandemia) na eletrificação da nossa frota, com empresas que trabalham com mobilidade e/ou logística se posicionando. A Uber planeja zerar as suas emissões de carbono até 2040. A Ambev pretende ter 50% da sua frota de caminhões totalmente elétrica até 2025, mesmo prazo no qual o Grupo Boticário se comprometeu a ter 100% de suas entregas realizadas por modais elétricos. E a Americanas está apostando tanto em bicicletas e tuc-tucs como em furgões elétricos, caso do eT3 da chinesa BYD, que foi o veículo elétrico mais vendido no Brasil em junho desse ano.
Fato é que o processo de eletrificação já é uma realidade e nos dá sinais sérios de problemas para o Brasil em um curto espaço de tempo. Além das questões já conhecidas e debatidas em artigos anteriores sobre as dificuldades de planejamento, altos investimentos em infraestrutura e um potencial problema de matriz energética, existe também uma questão fiscal a ser entendida, debatida e resolvida o quanto antes.
Os maiores crescimentos nas vendas de veículos elétricos no Brasil estão nos modelos do tipo híbridos flex, ou seja, carros elétricos ainda equipados com motor à combustão, por se tratar de uma tecnologia mais barata, possível de ser produzida localmente sem investimentos massivos e, como cereja do bolo, possuem benefícios fiscais que torna tudo mais competitivo. Já o cenário de veículos 100% elétricos, além de tudo que já vem sendo debatido e discutido, não é tão favorável porque o Brasil é um dos poucos países no mundo que taxa os veículos elétricos por peso, ou seja, quanto mais pesados, maior o imposto a ser pago.
Mesmo diante de tudo isso, a ABVE, Associação Brasileira de Veículos Elétricos aponta um crescimento das vendas de veículos eletrificados de 84% no primeiro semestre de 2021, em comparação ao mesmo período do ano passado. Independentemente dos números absolutos ante o tamanho da nossa frota que essa porcentagem de crescimento signifique, temos novamente a oportunidade de nos anteciparmos a uma série de problemas se decidirmos agora entender o fenômeno, discutir as necessidades e garantir que possamos fazer a transição da nossa frota para o modal elétrico da forma mais suave possível.